Tati Nefertati conversou conosco sobre: Hip Hop, militância, pan-africanismo e muito mais
Hoje no Quadro “Opinião Periférica” tivemos o prazer de entrevistar a jovem Tati Ribeiro Nefertari. Sem falar muito deixemos que ela se apresente e mostre suas ideias e seus ideais.
1- Primeiramente se apresente quem é a Tati?
Tati é uma mulher preta em eterna busca de suas origens, uma afrikana em diáspora, Pan-Africanista e amante do hip hop como ferramenta de luta, conscientização e libertação do nosso povo, acho que isso resume bem quem é a Tati.
2- Como você se enxerga dentro do Movimento Hip Hop?
Eu sempre tive dificuldade em me enxergar dentro do movimento, por diversas fitas, acho que principalmente por não estar diretamente ligada a nenhum dos 4 elementos, apesar de ter tentado ser dj haha, mas hoje dentro do movimento eu me enxergo dentro daquela parcela que faz parte do 5 elemento saca? A parada de estar produzindo textos, passando informação pra frente, e de certa forma entender o rap para além do senso comum, creio que seja importante no momento me enxergar assim, ainda mais nesses tempo na qual temos rap de direita, rap que faz blackface, que diz que nossa luta é mimimi e ate mesmo rap que reproduz uma pa de preconceito feito como diss pra uma musica que expõem fatos importantes como a Sulicidio.
(não sei se a pergunta foi nesse sentido, se n foi eu mudo kkkkk)
3- Qual a importância do Rap como articulador pra que você se aproximasse das ideologias que segue, da sua formaçao enquanto pessoa?
O rap foi fundamental e muito importante nisso, ele foi o meu primeiro movimento negro, quando eu nem sabia o que seria isso, foi ele quem me apresentou Malcolm X e vários outros pretos importantes pra minha formação assim como foi quem falou de África positivamente pra mim, é uma parada muito complexa sabe? Enquanto pessoa, acredito que o ganho maior foi estar consciente sobre a minha situação, aquela parada de saber que tenho que ser “2 vezes melhor” e entender que os meus problemas parte de eu ser uma mulher preta, da periferia e com isso ter um pouco mais de empatia com as pessoas no dia a dia. É difícil falar da grandiosidade do rap nisso tudo.
4- O Rap dos anos 90 era de certa forma, muito politizado, no sentido de cobrança do público mesmo pelo “real rap” que pautassem as causas da periferia nas letras. Você acha que os sons de hoje perderam um pouco desse poder?
Po, a parada do discurso de que o rap é musica livre na minha visão foi o que impulsionou a surgir raps cada vez mais despolitizados e um publico cada vez mais desinteressado nessas questões, o rap realmente é musica livre e pra mim sempre se tratou de liberdade, de uma liberdade que queríamos, mas não tínhamos, liberdade de poder ser alguém e se expressar da nossa maneira, liberdade de viver e uma pa de coisa a mais, mas o rap livre que tem surgindo por ae, é um rap reacionário e que de certa forma mais colabora com o discurso da classe dominante, acho isso problemático pra caramba, mas acho que os sons de hoje não perderam esse valor não e o debate do rap ser preto trouxe pra cena muito raps bons que mostraram que apesar de uma imensa mudança no cenário, os raps não propriamente dito de mensagem, mas o rap no geral ainda é um rap que se preocupa com a periferia, e acho que isso não vai mudar enquanto for feito por gente da periferia, é a nossa realidade.
5 - Você pode nos falar um pouco mais sobre a ideologia (não sei se fica melhor ideologia ou movimento) Pan-Africanista, e como isso te faz se afirmar enquanto mulher preta?
O Pan-Africanismo é um movimento de libertação negra, que tem como objetivo a total emancipação dos povos africanos, seja em África ou na diáspora partindo do principio da unidade/união entre nosso povo, assumindo um caráter anticolonialista e anti-imperialista sendo responsável não só pela luta contra a colonização da África como também em nos apontar a noção de raça e a construção de uma identidade nossa, uma identidade negra, é em relação a tudo isso minha afirmação enquanto mulher preta, de saber que faço parte de um povo com uma historia, uma cultura e me ver representada enquanto mulher preta através do matriarcado africano foi fundamental para meu entendimento de que ser mulher preta é foda, é algo precioso apesar de todos os perrengues, foi através do pan-africanismo o meu entendimento que eu, enquanto mulher preta sou Rainha e isso implica que sendo rainha, não aceito qualquer tratamento por ai, assim como não aceito o local que eles tem pra mulher preta, as suas subjugações. Como diria o Brown “eu vim da selva, sou leão, sou demais pro seu quintal” né? Hahah
6 - Desde que conheço você, sei o quanto você é envolvida nos rolês de Rap, e ao mesmo tempo também as pessoas parecem ter um carinho enorme pela sua pessoa. Mesmo com todo esse carinho, você já foi exposta a algum episódio machista? Você acha que hoje em dia, mesmo com todas as denúncias e exposições, os caras ainda se acham no direito de silenciar as minas no Hip Hop?
O machismo está ai né? E acredito que são poucos os homens do Rap que esta a fim de fazer esse debate, esse dialogo. Era muito comum chegar em rolé e ter que ficar provando pros marmanjos que eu também curtia rap e muita das vezes ate mais do que os próprios, ou ate mesmo ser resumida a “maria mic” por certos mcs que acham que a gente ta no rap por eles e atrás deles, são coisas cotidianas acredito eu na vida das mina que está presente no movimento. Por outro lado, temos agora mais representatividade em termos de gênero, do ser mulher no rap e isso tem diminuído um pouco os perrengues, aliado ao medo de serem expostos e denunciados, os manos tão sendo mais conscientes em nos respeitar.
7 - Você foi uma das pessoas que eu conheço, que mais se posicionou sobre o caso do irmão Rafael Braga. O que você tem a dizer sobre o sistema judiciário e carcerário do Brasil? Acredita em mudança?
O sistema judiciário e carcerário é racista, estar em cárcere é morte. Desde do pós falsa abolição que pessoas pretas são marginalizadas e encarceradas, em sua maioria o homem negro, o sistema carcerário tira toda a dignidade humana da pessoa assim como acaba com todas as possíveis possibilidades de um futuro melhor, o caso do Rafael Braga é a representação de todo esse sistema, e a parada de saber que em cada canto tem um Rafael, e que dentro das prisões há vários rafaeis é foda, eu não acredito em mudança por dentro do que esta posto, não acredito em reforma das prisões e do judiciário como tentam pautar como solução, acredito assim como Angela Davis, Assata Shakur e outras referencias é na abolição das prisões, na destruição delas, ate porque, as prisões foram projetadas para nosso controle, e o judiciário é majoritariamente branco, o poder é supremacista branco e o racismo comanda tudo, como ter dentro dessa logica alguma mudança positiva? Não tem. A gente teve um aumento absurdo do numero de pessoas presas, não só no sistema carcerário masculino, como no feminino também, a situação é foda.
8 - Indique duas ou três leituras e músicas para os leitores do blog.
Opa, de leituras eu indico Steve Biko- Eu escrevo o que eu quero, Assata Shakur – Escritos e autobiografia de Malcolm X, são livros de cabeceiras.
Musicas: As Margens- Palmares, Omnira part T Flow – Omnire Se e Dialeto Preto- Pretas Raizes
9 - Tem algo que eu não perguntei que você se perguntaria? Se sim, já responda.
Obrigada pela entrevista Tati, agradeço mesmo a disposição. Deixe um recado aos leitores do Noticiário Periferico.
Tem não, ta tranquilidade total. Eu que agradeço a vocês do Noticiário Periférico, mó honra, e o meu recado é aquele salve geral né, bora dar aquela ajudada nos corre dos nossos artistas bons, nessa época de “hype” como eles dizem né, ta cada vez pior o que tem sido consumido e colocado em evidencia, enquanto conhecemos muita gente boa e que muitas das vezes não fortalecemos nem essas pessoas também. E seguir honrando os propósitos do movimento né, e um deles é: sem racismo no nosso rap carai!
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+ Entrevistas anteriores - Laísa Gabriela conversou conosco sobre: rap, intolerância religiosa, representatividade, sua caminhada na comunicação e muito mais.
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