Sentimentos, impressões e referências da musica "Jogo de Negro" do Projeto Preto


"Jogo de Negro" que foi produzido pelo DJ Neew, é o segundo single do grupo de rap paulistano Projeto Preto
O grupo é formado por: Anarka, D'ogum, Denvin e Vibox.
Na descrição em sua pagina no facebook, o grupo diz que o Projeto Preto é um grupo que tem como perspectivas centrais a auto-afirmação de vida e reconstrução da identidade e auto-estima de pessoas negras.
A musica "Jogo de Negro" deixa isto bem claro, pois a letra desta musica é bem intimista, e cada MC passa sua visão e sentimento sobre ser preto nesta sociedade racista. 
Você vai se identificar com cada verso desta musica. Confira.


Ócio sempre foi utopia, a realidade era as barcaTiroteio na favela e no barraco as marcaEscravocrata imperial, racismo estruturalSempre apagou minha história e fez sonhar com as parafal

A Mc Anarka em seus versos rima sobre o "Racismo estrutural". (se puder leia Como funciona o racismo estrutural – por Flávia Simas)
Quando ela cita "ócio sempre foi utopia e a realidade era as barca" ela fala sobre nossa falta de sossego pelas incursões policiais nas favelas, pois "barca" pra quem não sabe é carro de policia, na minha quebrada barca era as "blazer" (Bleizona). Estas ações são feitas com truculência e em muitas vezes morrem inocentes, e para justificar esta morte de inocente esta vitima vira traficante.

Tentando fazer uma analogia atual do que seria o escravocrata imperial, hoje seria os donos de grandes empresas e corporações que usam da mão de obra bem barata, e em muitas vezes explora o trabalhador, no caso de corporações multinacionais chega a um trabalho de semi escravidão.

Se tem algo em que os eurocentristas sabem fazer de melhor é apagar a historia negra e embranquecela, exemplos: o povo do egito, os hebreus, vários povos do oriente médio, personalidade famosas e por ai vai. Toda esta revolta obvio que da vontade de pegar em armas, no caso a "parafal"



Nariz largo, não me agrado, os traço sempre foi fardoPadrão eurocentrado, onde não ser branco é erradoAlisou meu cabelo, ofuscou minha cor, quis me transformar em barbie e minha religião deturpou

Neste verso a Anarka fala do peso que é não ter sua beleza reconhecida, por culpa de um padrão que nos é imposto.
Por causa do padrão de beleza euro-centrado, crianças, adolescente e até adultos, acabam renegando e tendo vergonha de seus traços físicos.
Ter nariz largo é feio, cabelo crespo é sinônimo de duro, ter a pele escura pra muitos se torna um fardo bem pesado.
Num mundo onde o padrão de beleza é branco, no ramo de brinquedos não é diferente, nossas meninas negras em sua maioria cresce sem referencia de beleza negra ou heroína negra, e muitas de nossas criança pensam e querem ser brancos, afinal o sistema nos faz pensar que o mundo é branco né pae.
Como o mundo é branco, as religiões afro sofrem muito com a intolerância religiosa, não existe religião mais perseguida que o candomblé e a umbanda. O que eu mais ouço é que eles praticam o mal, mas mal sabem que os Orixas representam elementos da natureza.
Um exemplo, Thor o deus nórdico (branco) do trovão é legal, mas Xangô (Preto) orixá que representa o trovão e o fogo é demonizado. Se Xangô fosse branco teria até filme em sua homenagem.
Preceitos de Alan Kardec é legal e é a tal da "Mesa branca", já as religiões de origem afro são espíritos malignos ou involuídos como o próprio Kardec dizia.
Entendeu..? parafraseando a Anarka "Padrão euro-centrado, onde não ser branco é demonizado".


Só que Xangô vingouExu me guardouDandara libertou e do enê fui pra nagôSubversão constou, as corrente quebrouAqui vos fala mais uma preta que vocês não matouContra a estimativa que cês deram, anota aí que eu vou viver muito mais do que cês me impuzeramCria de Black Panther, Malcolm X, meu sinhôVim pra pegar de volta tudo meu que cê roubou

Verso D'Ogum
Nasci sem sentidoContido na continênciaDo racismoIntrojetando apagandoCom veemênciaO ódio ao narizA boca e a própria corSer chamado de mulatoPardo, é fardoQue aumenta a dor

Nesta parte o rapper D'Ogum fala sobre o racismo embranquecedor, ele em muitas vezes é sutil, mas é cruel e provoca um misto de vários sentimentos e questionamentos internos do tipo "ser ou não ser preto" taligado..? Quando se é negro e tem pele clara e você se declara preto, isto gera muitos comentário tipo "você não é preto é pardo".
Pardo e Mulato são termos racistas criado nos tempos da escravidão.
Muito se comenta da origem do termo "Mulato" de ser de origem árabe  mowallad ("filho de árabe e estrangeiro"), mas etimólogos descartam esta hipótese.
A palavra "Mulato" vem da palavra "Mula" seja em português ou espanhol, que são línguas latinas, a origem da palavra vem do latim "Mullus" que é um animal hibrido (mistura de raças), que nasce do cruzamento do jumento com a égua ou do cavalo com a jumenta.
Pardo é bem complexo, mas resumindo é um termo que foi usado primeiro para um sistema de casta em colonias espanholas, tipo algo hierárquico.
São dois termos racista para denominar pessoas negras com tons de pele diferente, toda esta confusão étnica só nós traz dor, negação de nossa etnia e vontade de ser branco.


Meia alta na canelaSequela como herança190 perseguia, lembrançaBoa esperança

Este pedaço de verso é bem interessante, o D'ogum faz um tipo de analogia (comparação) sobre a perseguição policial, com a perseguição e captura de africanos para serem presos e escravizados. Pois "Boa esperança" era o nome de uma caravela portuguesa que trazia escravos ao brasil.
Tipo comparando as incursões policiais nas favelas, com as incursões dos europeus na africa. Pois ambas caçam pretos em vulnerabilidade.


Nessa andança, auto-ódioAgora to sem perdão,pique Felipe boladaoVerso sujo, cerro o punho, contra tudo de opressãoCuzão, queMarcha pra Jesus, correndo com o DiaboRoga ódio no axé, na minha féNo meu gingadoDa sua bala eu to blindadoRacista atrasa, medo alastraNa encruza será Cobrado

Nesta parte do verso o D'ogum, ele fala sobre libertação,empoderamento e encorajamento taligado..?
E ainda manda um papo reto para os cristão que são falsos moralistas, falsos santos, pastores pilantras, crentes alienados que adoram demonizar as religiões afro.
Um exemple de "Cuzão que marcha pra jesus, correndo com o diabo", sãos crentes a favor da pena de morte, pastor que rouba fieis pedindo dízimos e fazendo campanhas pedindo grana e etc.


Palmeiras, Palmares, PalmasJurema, zumbi, cabaçasMarimbas, mocambos, palhas, meus verso cacimbas vastasReflete caras frustradasEssa é pra quem dizia dos 18 ele não passa

Como foi dito la na introdução esta musica é bem intimista se você chegou até aqui já deve ter percebido, o D'ogum, fala sobre confusões mentais (auto-ódio), questionamentos, para depois vir mostrando força, que não vai abaixar a cabeça e que luta contra este sistema racista. A parte do D'ogum eu vejo como algo evolutivo.
Ele coloca todo um sentimento talvez guardado deste a infância. Eu deduzo isto pelo contexto e pelo final "Essa é pra quem dizia que dos 18 ele não passa".




Desde pequeno espancado e chamado de feioFilho bastardo, zoado, nunca amado, me odeioSentado no canto da salaSempre perturbado pelos outros, que me deixava em prantosMe falaQuem é o macaco ou o pé de barro?Zoam minha boca que se tornou motivo até de sarro

Este é um dos versos mais intimista da musica, nesta parte a impressão que passa é que o Denvin expõe uma situação que aconteceu com ele, eu pensei em dizer que seria bullying, mas perseguição por cor da pele não é bullying é racismo mesmo.
Se reparar nesta parte o mano Denvin, fala de agressão física e verbal e de auto-ódio. Quantas crianças não passam ou estão passando por isto.?
Não tem muito tempo uma menina negra sofreu com atos racistas na escola e o professor ou diretor queria que a garota que era a vitima pedisse desculpas. Só não vê quem não quer, mas vivemos numa sociedade com um sistema muito racista.


Me dedico ao Rap pra chutar os cu de rappersSou o criolo que ama caçar os WoodpeckersSou preto guerreiro, nunca cover de heróis que...Enche o nariz de pó e morre de overdose

"Ceis" adoram puchlines né..? pega esta pae!
Vamos "dixavar" esta parte aqui "Sou o criolo que ama caçar os Woodpeckers"

Primeiro eu acredito que o Denvin usou o termo "Criolo" fazendo alusão ao termo racista "nigger" ou "nigga", muitos filmes traduzem a palavra "nigga" como mano, mas ela depende de contexto, pois quando é usada por um branco é ofensivo e racista. Dai não é mano ,tentando traduzir seria Criolo.
Woopeckers ou Peckerwood, é um termo uma gíria que teve origem no sul dos estados unidos usado para pica pau. O termo surge quando gangues de brancos pobres racistas entravam em constante conflito com gangues de negros, o termo tem origem num dialeto "Afro-americano"  Este termo se popularizou em conflitos dentro da cadeia que depois ganhou as ruas.


Tentam pintar o Rap de brancoAbafam a nossa luta e colocam nossos moleque no banco

Nesta parte ele fala sobre Abafar nossa luta, apesar desta musica sair antes da musica "rap lord" do Haikass, posso usar o verso do Spinard como exemplo, ele diz que "MC que luta por minoria é iludido". Mc boy, branco com todo seu privilegio perante do sistema querendo abafar a luta dos preto no rap saca..? 
Outro exemplo disto é o som "Grimme" do Costa Gold dupla de MC brancos, onde eles colocam os pretos dançando de fundo e rimam dizendo que eles (Predella e Nog) são os "Niggaz da Pompeia". Branco nigga só no brasil mesmo.

Projeto Preto se tornou um clã forteOdeio heróis brancos, prefiro o HancockSomos melhores do que o seu hit popA fúria negra ressuscita pra salvar o Hip-Hop

Neste verso o Denvin em mais uma punch foda, fala da tomada do protagonismo preto no rap, porque atualmente os rappers brancos tem sido mais valorizados que os rappers negros, não só por culpa deles, mas o padrão branco é o mais agradável ao novo publico do rap.
O Denvin termina a musica valorizando heróis negros e cita o Hancok que foi interpretado pelo Will Smith no cinema. 
Uma curiosidade de que eu não lembrava inclusive conversando com o Denvin ele me alertou sobre isto, o Hancok ele é um anti-herói que carrega todo um esteriótipo do negro, bêbado, desastrado, mendigo e etc.
E mesmo sendo um herói estereotipado ele prefere ao Hancok do que aos heróis brancos, bonzinhos e bons moços que depois de tudo volta pra casa e vivem sua vidinha privilegiada.

Ouça:


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